Síndico, você merece a Inadimplência que tem?

Compartilhe essa matéria

Você merece a inadimplência em seu condomínio ou não? Se você, como síndico, não conhece o processo da cobrança do condomínio que administra, como pode esperar que os condôminos a conheçam e o cumpram? Responda rápido: qual a data de vencimento do boleto do seu condomínio? Essa é fácil, todo mundo sabe. Vamos às próximas perguntas...
inadimplência

Você merece a inadimplência em seu condomínio ou não?

Se você, como síndico, não conhece o processo da cobrança do condomínio que administra, como pode esperar que os condôminos a conheçam e o cumpram? Responda rápido: qual a data de vencimento do boleto do seu condomínio? Essa é fácil, todo mundo sabe.

Vamos às próximas perguntas: O que acontece se o condômino não paga? Recebe uma notificação? Com quantos dias de atraso? Notificação por escrito, por email, ambos? A notificação tem protocolo? Quem emite? Aliás, quem redigiu o texto da notificação? O que ele orienta a fazer? Esse texto está em consonância com os limites previstos no Código Civil ou transgride direitos do condômino, gerando risco judicial? Qual o prazo que ele dá para o pagamento?

Começou a ficar na dúvida, né? Tá, vamos adiante. E se ele recebe essa notificação e não paga, o que acontece? Outra notificação? Quantos dias depois? O que tem escrito dessa vez? É igual à anterior ou o tom subiu? Quem emite? Em papel ou email? Com ou sem protocolo? Quem entrega? Quem controla os envios e recebimentos?

Eu poderia ficar fazendo mais outras mil perguntas sobre o detalhamento do processo de cobrança, conhecido como régua de cobrança, mas provavelmente você não sabe responder e está começando a ruborizar. Então, creio que já deu pra entender a mensagem.

Muitas vezes a inadimplência é culpa do síndico

Uma boa parte da inadimplência do seu condomínio é culpa SUA. Se você simplesmente terceiriza a responsabilidade pelo acompanhamento desse processo, se não o conhece a fundo, ou pior, se esse processo nem existe, me desculpe, mas você não tem o direito de se surpreender com o fato que as pessoas não pagam as cotas condominiais em dia.

Veja, não estou aqui dizendo que você precisa viver e respirar o processo de cobrança no seu dia a dia, não é a sua tarefa operacionalizar isso! Mas estou afirmando que é essencial que, em algum momento, você se debruce sobre esse processo para entendê-lo, criticá-lo, aprimorá-lo, validá-lo, formalizá-lo e certificar-se que cada pergunta acima tenha a sua respectiva resposta. Na verdade, essas e muitas outras perguntas…

Uma vez definida a régua de cobrança em TODOS os seus detalhes, tipo: quem faz o que, quando, como, por que, qual o custo, se está validada e formalizada em assembleia, é importantíssimo gerar os mecanismos de acompanhamento e controle que permitirão que consiga enxergar com facilidade e rapidez o status de cada engrenagem dessas para averiguar se está realmente funcionando.

Acompanhar a régua de cobrança para diminuir a inadimplência

O condômino atrasou, a notificação foi emitida? O porteiro colheu o protocolo de recebimento da pessoa certa? O inadimplente pagou dentro do novo prazo? Pode parecer complexo controlar isso, mas como a maioria das coisas na gestão eficiente, é simples. Para saber, por exemplo, se as notificações estão sendo emitidas adequadamente, é só incluir o síndico na lista de inadimplentes de todos os meses como um “devedor fake”. Se ele receber as notificações todos os meses, então saberá que o sistema está funcionando corretamente. Viu como é simples e não exige esforço algum?

Minha experiência corporativa mostra que muitas empresas possuem POPs – Procedimento Operacional Padrão super bem desenhados e estruturados, mas que não são colocados em prática conforme descrito, e por isso acabam não valendo de nada. Processos lindos, mas mal operados, são tão nocivos quanto processos mal estruturados, mas bem executados. E como tudo em gestão, se não há controle, não há administração de nada, e acaba sendo totalmente inócuo.

A comunicação é crucial para diminuir a inadimplência

O passo final, e igualmente crucial, é a comunicação dessas regras. Ora, se só quem foi na assembleia de aprovação desse processo de cobrança ficou sabendo dele, então você está lascado. É preciso investir PESADO em comunicação e garantir que 100% dos condôminos e moradores foram atingidos por ela. E aqui há dois aspectos importantes a serem observados.

O primeiro são as instruções em si: o que fazer, como fazer, quais os balizadores legais e as consequências do descumprimento, essas coisas. Ok. Mas o segundo ponto é: se a implementação de um processo bem estruturado é uma novidade num condomínio com histórico de inadimplência alta, a chegada de uma régua detalhada como essa vai contribuir para mudar uma CULTURA de “ah, se sobrar dinheiro eu pago esse condomínio, e se não sobrar, não vai dar em nada mesmo… Depois eu vejo isso…” E segue empurrando com a barriga.

Por isso, recomendo:

  • Deixe claro como tudo vai funcionar, especialmente quais as sanções previstas para o descumprimento dessas regras;
  • Não divulgue esse novo processo por apenas um meio. Dê ampla publicidade às novas regras através de papeleira, tela de elevador, email, boletim informativo e todas as formas disponíveis no condomínio para se certificar que alcançou a todos;
  • Defina a partir de quando elas valerão. Evite dar um “susto” nos condôminos implementando regras mais rígidas da noite pro dia. Dê um prazo de uns 30 dias e deixe claro que, dali em diante, as novas regras serão cumpridas à risca;
  • Findo esse prazo, aplique as regras. Eu sei que é óbvio, mas muitos síndicos ainda buscam suprir sua carência por afeto e reconhecimento sendo “bonzinhos” e desconsiderando o que consta nos processos que definiram e aprovaram. Essa é a melhor maneira de colocar todo esse trabalho em risco, perder o controle da Inadimplência e o respeito dos moradores. Se tem regra e não cumpre, então pra que rega? As primeiras notificações e multas serão didáticas, e todos verão que “aquela conversa” era pra valer. E a cultura da inadimplência vai começando a mudar…

Faça isso e assista a inadimplência começar a cair.

A garantidora pode ajudar a diminuir a inadimplência

É neste ponto que você me pergunta: “mas Sérgio, não é mais fácil contratar uma garantidora?” E eu te respondo na lata: você está atrás do mais fácil ou do mais vantajoso?

Leia também – Cobrança de Inadimplência em Condomínios: Gestão, Estratégias e Benefícios

Uma garantidora é uma espécie de factoring, que compra uma dívida em troca de um deságio. No caso, ela assume o risco da carteira de cobrança, incluindo os atuais inadimplentes, em troca de uma remuneração, que geralmente é um percentual sobre o valor da receita. Então se a receita total a ser arrecadada com cotas condominiais é de R$100 mil e a taxa cobrada pelos seus serviços é de 10%, ela te entrega os R$100 mil e te cobra R$10 mil, portanto o que você efetivamente terá em caixa serão R$90 mil, confere?

Muito bem. Vamos imaginar que a sua inadimplência hoje seja de 15%. Então, em tese, vale mais a pena ter uma garantidora cobrando 10% do que ter uma inadimplência de 15% e dor de cabeça pra gerenciar esse processo. Só tem uma coisa que não te contaram. E eu vou te contar. Já parou para se perguntar por que ela propôs 10% de honorários pelos seus serviços? De onde veio esse número? Por que não 8,7%, 9,54% ou 12,3%?

Toda taxa incorpora o nível de risco da operação. Isso também vale para juros, e a prova disso é que os juros do cartão de crédito são estratosféricos enquanto que os juros dos empréstimos consignados são baixinhos. Por que? Um é muito mais arriscado do que o outro. Se há no condomínio uma cultura de inadimplência alta e histórica, gerada pela inexistência de um processo de cobrança bem estruturado e pela falta de controle, o risco dessa operação cresce, e a garantidora cobra mais caro.

Por outro lado, num condomínio onde há uma régua bem definida e implantada, onde os controles são amarrados e o processo funciona, certamente o risco é muito menor, mesmo que ainda exista algum grau de inadimplência. Risco menor, custo menor. Portanto, mesmo que a adoção da garantidora lhe pareça o melhor caminho, isso não dispensa a adoção de uma boa régua de cobrança, no mínimo para dirimir riscos e baixar os custos.

inadimplência

Te convido a pensar como um financista: por que aceitar 15% de inadimplência ou pagar 10% de honorários a uma garantidora se a raiz de uma parte significativa do problema está em algo que você, síndico, pode reduzir bastante simplesmente ajustando um processo?

Artigo de Sérgio Gouveia | Administrador de Empresas, MBA em Finanças, Certificado em Gestão e Estratégia pela Fundação Dom Cabral. Professor formado pela Universidade de Cambridge e treinador de professores certificado pela International House, ex-diretor de empresas, empreendedor e síndico morador. Influenciador no Instagram no perfil @derepentesindico

Por: Sérgio Gouveia